Usar dados inconsistentes para tentar anunciar a morte do Linux não faz sentido. É marketing e nada mais.
Dada a comemoração que cerca as informações da Microsoft e de outras empresas do mesmo tipo sobre a participação de seus sistemas operacionais no mercado, as declarações acerca da morte do desktop Linux fazem sentido.
Afinal de contas, relatórios de mercado vêm, há meses, mostrando a participação do Linux estagnada na casa dos 1%. Em setembro, aliás, esse número caiu para 0,85%, segundo um estudo conduzido pela Net Applications.
O problema desse tipo de estudo é que eles não servem de base para mensurar o desempenho de softwares livres. Os números apresentados se servem, normalmente, de informações sobre as vendas e seguem uma fórmula absolutamente rudimentar. X cópias do Windows vendidas por mês equivalem a Y% de participação no mercado, e ponto.
Mas, pense bem, de que forma as distribuições Linux são adquiridas? A não ser nos casos, para lá de raros, em que junto do software, segue uma assinatura de suporte (pago), o Linux é baixado sem qualquer custo.
Sim, existem sites como o DistroWatch, que mantém um histórico de distribuições Linux baixadas e são capazes de providenciar dados concretos e relevantes sobre a adesão de usuários a determinadas distribuições, mesmo que em baixa escala.
Também há um monitoramento – bastante recente – do número de Ubuntu Linux que vêm sendo entregues em equipamentos OEM (preinstalados em equipamentos novos).
Mas, analisando de forma sóbria, é praticamente impossível determinar quantos sistemas Linux são usados em desktops ao redor do mundo. Nem o monitoramento dos downloads é capaz de prover essa informação em função da fácil e legal distribuição livre de cópias do sistema. O que se coloca à frente é um desafio que precisa ser encarado.
Então. Será verdade que o Linux para desktops “já era”? Acho que não. Eis o porquê:
1. Mais de um terço das empresas usam
O dado mais concreto que pode ser obtido do levantamento realizado semana passada pela Linux Foundation, é que o Linux está erradicando o Windows das máquinas servidoras. E a previsão para os próximos anos é ruim para a Microsoft. Os servidores são, assim por dizer, o ambiente perfeito para o sistema do pingüim, então o sucesso do Linux nos servidores não é nada novo.
O que deveria ser comemorado em alto e bom tom – e não se sabe por que isso não aconteceu – foi o crescimento do uso de sistemas Linux nas estações de trabalho corporativas. De acordo com esses dados, 36% das grandes empresas rodam uma distribuição Linux e outros 12% avaliam a possibilidade de migrar para o software livre.
Quer saber? Na minha opinião, isso não reflete a realidade de um sistema “morto”, estou enganada?
2. Consumidores
Importante ressaltar que os números da Net Applications (0,85%) não são a única fonte de informações disponíveis no mercado. São apenas os mais divulgados.
A W3Counter, por exemplo, dá conta de 1,5% de participação do sistema em setembro. É um pouco mais que o divulgado pela Net Applications, mas já é alguma coisa. No relatório da Wikimedia, referente ao inverno deste ano, o Linux salta para 1,9% de share e, na mais positiva das avaliações, publicada pela O´Reilly Media, um em cada dez PCs estão munidos com o Linux.
É certo que, atualmente, não é possível determinar quantos usuários de Linux existem e traçar conclusões com base nessas informações é igual realizar um censo apenas contando as pessoas que andam na rua e ignorar quem está em casa.
3. O fator Ubuntu
Como se os argumentos acima não estivesse evidente que o Linux não está morto, é preciso falar na distribuição mais simpática ao usuário dos últimos tempos: o Ubuntu. Eu confesso que jamais vi tamanha excitação em torno de uma distribuição como a que cercou o Maverick Meerkat, versão 10.10 do Ubuntu.
Mas nem isso pode ser apreciado com o surpresa, dado o fato do Ubuntu ser a marca mais poderosa do universo Linux. Os números da DistroWatch confirmam esse sucesso. O 10.10 é, sem sombra de dúvida, a versão mais prazerosa de usar entre todas do Ubuntu. Com recursos de suporte ao multi touch na distribuição voltada ao pacote para netbooks, o Marverick Meerkat dá um show digno de assistir. O departamento de pesquisa e de desenvolvimento da Canonical, responsável pelo Ubuntu, dá sinais de não parar por aí.
Com o Ubuntu, vários fantasmas que rondaram o sistema operacional Linux no passado desaparecem. É o caso dos drivers de dispositivos. Segundo o grupo de usuário Linux de Sydney, na Austrália, o Ubuntu tem conseguido reanimar uma parcela de ex-usuários do sistema Linux e também tem sucesso ao conquistar uma base de usuários cada vez mais larga, incluindo escolas e agências governamentais.
Eu não quero dizer que de agora em diante o futuro do Linux será nada além de flores e que os desafios desapareceram.
Um dos fatores que mantém a Microsoft na liderança é a inércia promovida, em minha opinião, pela Redmond. Outro fator que atrapalha a disseminação do Linux é a fragmentação existente na gestão das estratégias corporativas. Essa veia de marketing é o mais forte motivo da Apple ser a potência que é.
Cabe, ainda, perguntar qual é a relevância de sistemas desktop no futuro. A chegada da computação fortemente baseada na nuvem pode minar a importância desses sistemas.
Então, afirmar que o Linux está morto e velar sua alma como se o sistema fosse coisa do passado é uma das atitudes precipitada. Mais de um terço das empresas o usam e ele está nos discos rígidos e pendrives de mais computadores domésticos que se pode imaginar. Em parte graças ao Ubuntu. Na perspectiva corporativa a ausência de licenças e a robustez do sistema também o fortalecem.
O marketing pode ajudar a manter a dominância do Windows por mais algum tempo, mas propaganda tem efeitos limitados, ainda mais em tempos de corte de custos em que não se pode abrir mão de produtividade. Não vai demorar e o Linux assumir a merecida posição de alternativa atraente para todos os fins.
PC World/EUA